Faculdade de Ciências da Universidade de LisboaInvestigador diz que “desordenamento do território” é o maior culpado pelos incêndios florestais
31.03.2008 - 10h59 Lusa
O "desordenamento do território" é o maior "culpado" das grandes áreas ardidas todos os anos em Portugal, seguido da "incontrolável" meteorologia, de acordo com um investigador português da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que desenvolveu um modelo de previsão dos fogos do Verão. Carlos da Câmara, do Centro de Geofísica daquela Faculdade, desenvolveu um modelo que consegue determinar como vão ser os meses de Julho e Agosto, que representam 70 por cento da área ardida de todo o ano, através da precipitação de Março e Abril e da temperatura de Maio e Junho. "O raciocínio é simples: imaginemos que Março e Abril são particularmente chuvosos, o que leva ao desenvolvimento do mato, e depois que Maio e Junho são meses secos, o que torna a vegetação seca e muito mais inflamável. O risco é muito maior", explicou o professor. De acordo com o climatologista, desde 1980 que as áreas ardidas têm vindo a aumentar, tal como o "desordenamento" do território, o que resultou nos anos "negros" de 2003 e 2005, em que arderam, respectivamente, 425.726 e 338.262 hectares de floresta e matos, segundo dados oficiais. "O clima é o bode expiatório dos políticos, porque é muito fácil dizer cada vez que há uma calamidade que é o El Niño ou o efeito de estufa. Quem tem culpa dos fogos somos nós, portugueses, que permitimos que o ordenamento do território em Portugal esteja desta forma. O problema não é deste ou daquele Governo, foram 40 anos de negligência colectiva", salientou. Segundo o professor, se o planeamento do território fosse maior, ajudasse ao combate aos fogos e o tornasse eficaz, esse ordenamento iria contrariar a meteorologia e o modelo não resultaria tão bem, como acontece, por exemplo, em Espanha. No país vizinho, segundo o especialista, "quando começaram a fazer ordenamento do território a sério, a meteorologia continuou a ser importante, mas deixou de ser o único factor" para a previsão e prevenção dos fogos. "Quando o ministro da Administração Interna disse que no ano passado ter ardido pouco foi devido aos meios de combate, eu discordo. Aquilo é puramente uma opinião e eu tenho um modelo físico-matemático que prova o contrário", salientou. Para o professor da FCUL, a questão é que Portugal aposta sempre no combate e nunca na prevenção, deixando "a meteorologia jogar o seu papel". "Nós e a Grécia somos o último laboratório da Europa onde se podem aplicar estes estudos porque a meteorologia continua a ter um papel muito importante", explicou. Para a próxima época de fogos, o investigador considera que é ainda "muito cedo" arriscar qualquer previsão, mas adianta que "em Maio já há dados importantes para a planificação". Este modelo de previsão dos fogos do Verão está inserido no projecto europeu Land-SAF, liderado pelo Instituto de Meteorologia. O projecto foi desenvolvido em colaboração com vários investigadores da faculdade, do Departamento de Engenharia Florestal do Instituto Superior de Agronomia, da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e do Instituto de Meteorologia.
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